A sala está ladeada por grandes cortinas negras. Abajures conferem ao recinto uma languidez morna e triste. F.T. está sentado em uma das mesas, bebe seu vinho tinto. Tamborila os dedos sobre a superfície de madeira, os olhos perdidos parecem procurar por alguém. M.M. cruza o saguão, os olhos sentenciosos, o passo vagaroso. Veste-se à moda antiga: pince-nez e um paletó com cheiro de guardado. “Nos encontramos novamente”, disse M.M. ao se aproximar de F.T.
F.T. se levantou e apertou sua mão, com reverência.“Não esperava encontrá-lo agora”, disse sorvendo mais uma taça de vinho.
“Era necessário que eu viesse. Você parece ter esquecido os termos do acordo, meu caro”, declarou M.M. com a voz mansa.
“Não esqueci. Mas não te recordas que o pacto só vence quando eu completar 35 anos? Faltam oito anos ainda”.
“Eu nunca esqueço os detalhes de um contrato. Apenas senti saudade e vim te ver. Andas diferente, mais feliz. Pensei que essas mudanças de itinerário haviam te dissuadido do que foi acordado”, explicou o senhor do pince-nez.
“O senhor já amou?”, perguntou F.T. ao homem de paletó com cheiro de guardado.
“Incondicionalmente a todos!”, respondeu M.M.
“Amor é sentença, é a lógica do absurdo”, falou de súbito F.T., baixando os olhos.
“Ela vai te trair, é inevitável. Com o tempo, a monotonia vai consumir tudo, como bicheiras sobre um cadáver. Sabe por que ela sempre diz que te ama?
“Não, não sei...”, responde F.T.
“Não é amor. Na verdade o “eu te amo” é um auto-elogio, é um panegírico para si mesma.”
“Por que você está falando isso?”
“É para que você não esqueça. Mas agora tenho que ir. Nos vemos daqui oito anos”, disse M.M.
“Eu sei, já está feito.”
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